20 de março de 2005

Será que a juventude ainda é uma banda numa propaganda de refrigerante?


Fico preocupada com a banalização da perda da identidade defendida por alguns formadores de opinião. Jovens são, sem medo de generalizar, influenciáveis sim! Leciono para adolescentes por mais de cinco anos e esta afirmação é incontestável. Graças a Deus, nem todos os jovens têm como modelos o Charlie Brown Jr, Marcelo D2, CPM 22 e outros estereótipos de Peter Pan às avessas (tenho 42 anos, mas vou me comportar como um moleque para ser popular entre a faixa etária mais frágil). Chamo os jovens de influenciáveis não somente por causa daquele papo piegas de que “eles estão passando por uma fase conturbada, não sabem ao certo o que querem e blá blá blá” (até mesmo, porque tenho alunos de 13 anos que já sabem o que querem para a sua vida e o que acham dispensável e/ou inadequado). Os chamo de influenciáveis porque todos nós (não somente quando jovens) seguimos modelos e exemplos de alguém a quem admiramos, sejam eles celebridades ou familiares. Um jovem que tem um modelo de vida (nem que seja por alguns meses ou anos) vai defendê-lo, amá-lo e tentar fazer com que as pessoas com quem convive acreditem nas virtudes de seu ídolo; para eles a maneira mais fácil de expressar tais virtudes é, muitas vezes, as copiando. Resumindo, seja o Chorão ou Ghandi, o exemplo escolhido será imitado e, até mesmo, cultuado.
Acredito muito na coerência e por isso recrimino (e até condeno... porque não?) atitudes como a do Chorão, do CPM 22, do Falcão e do D2 por deixarem todo o papo ideológico de lado para vender um produto que nada tem a ver com o ideal que pregam. Querem consumir, ok, mas não precisam tentar convencer ninguém dos benefícios desta ou daquela cerveja, deste ou daquele refri, só para que suas carteiras fiquem recheadas com uma grana que não foi oriunda de seus shows nem da venda de seus cds (combinemos que, para “artistas” como eles, não é pouca). Diferente do que pensa algumas pessoas que trabalham nesta área, música é (ou pelo menos deveria ser) acima de tudo uma expressão artística...é arte e não simples mercadoria. É lógico que o músico sem propaganda não vende seu produto, mas é o seu produto que deve ser vendido, não o músico. Muitos artistas sempre foram, ao longo de suas carreiras, coerentes com a sua forma de fazer e expressar a arte, não é assim tão difícil. Por isso é que não entendo essa ânsia de ganhar grana corrompendo e sendo responsável por uma péssima influência. Agora tem até artistas “globais” fazendo propagandas demonstrando para aposentados as facilidades de adquirir um empréstimo em bancos privados, sem sair de casa e tendo tudo descontado direto de suas pensões ou aposentadorias...”em até 40 meses e com juros pequenininhos!”
Acho igualmente absurdo comportamentos inadequados durante um show com censura livre ou de, no máximo, 13 anos. Marcelo D2, por exemplo, grita várias vezes (como pude ver em um show apresentado pela MTV): “Quero ver fumaça aí...tem pouca gente fazendo fumaça aí...!” e, em seguida: “agora, vou chamar meu filho”...e o guri ainda canta “evoluo com o meu pai!”... tenha dó! O Chorão, por sua vez, fica incentivando aquelas rodinhas ridículas de gente se debatendo. Sem falar no Dinho Ouro Preto que não canta, só fica dizendo: “Do caralho...pô, do caralho...” a cada 5 minutos.
Mas há esperança! Por outro lado existem artistas de verdade como Herbert Vianna que, como pude presenciar em um show aqui em Porto Alegre, parou o show a fim de apartar, verbalmente, uma briga que estava acontecendo no meio da multidão. Fiquei mais apaixonada do que sempre fui pelos Hermanos (especialmente, neste caso, Camelo) por terem a sensibilidade de perceber, em seu último show no Bar Opinião (onde compareceram, pasme, quase quatro mil pessoas...sim...no Opinião...imagina o atrolho) que havia muito mais pessoas do que a capacidade do local. Num gesto simples, Camelo pediu para que as pessoas deixassem os pulos para uma próxima ocasião, pois as pessoas poderiam se machucar (lembro que ele brincou, dizendo: “Putz, qualquer dia a gente vai ter que voltar pro Araújo”, pois já haviam estado lá na época da febre “Anna Julia”... e realmente, o show que teve depois foi mesmo no Araújo...adivinha, lotou). Acho que artistas como Camelo tem, sim, o direito de dar sua opinião (principalmente quando inserida em um contexto) nas poucas entrevistas que concede; afinal, suas opiniões não são segredo para quem ouve suas músicas, ele as deixa bem claras.
Por último, mas não menos importante, acho que perder sua identidade só por causa de grana, fazer apologia a drogas, álcool e violência é pior do que aumentar salário de deputado, pois os danos são infinitamente mais dolorosos: no caso dos deputados, é só não votar mais nos que acham justo ganhar uma fortuna; mas e no caso dos milhares (se não milhões) de jovens que morrem por dirigir embriagado, ou por terem sofrido uma overdose, ou por terem cabeceado o nariz de alguém e terem levado uma facada, ou um tiro. Artistas têm, e acho que sempre terão, o poder de influenciar positiva ou negativamente às pessoas que os assistem, ouvem. A mídia, em sua grande maioria, no entanto está aí para selecionar o que deve e o que não deve ser aceito pelos jovens. Convenhamos, quer melhor maneira de acabar com uma ideologia do que comprá-la e expô-la a exaustão até que se torne banal e fraca? Caso saiba uma maneira mais rápida e eficaz de prender as mentes e fazer com que desistam de suas idéias e de seus ideais, mande imediatamente para jornalismo@globo.com ou, quem sabe, zerohora@clickrbs.com.br , com certeza, esta informação será muito bem aceita.